Mesmo em casos anteriores à sua vigência, Judiciário já utilizava LGPD para embasamento de decisões

A Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018), visando a proteção de direitos fundamentais como a privacidade e a liberdade, regulamenta o tratamento de dados pessoais, tanto por pessoas físicas, quanto por, principalmente,  empresas públicas e privadas. Mesmo que suas sanções administrativas ainda não sejam aplicáveis, possuindo previsão para apenas agosto de 2021, a LGPD já está vigente desde 21/09/2020. Com isso, tem força para responsabilização civil desde esta data.

Caso anterior à vigência da LGPD

No processo nº 1004583-51.2020.8.26.0344, distribuído em abril de 2020, anterior ao início da vigência da LGPD, a 1ª Turma Cível do Colégio Recursal – Marília proferiu interessante Acórdão. A decisão discute essencialmente a legalidade acerca da coleta de dados, seu armazenamento, e a necessidade de consentimento do consumidor para tanto.

A Ré, que é empresa de sistemas e gestão tecnológica, buscava com o recurso a redução da indenização de danos morais, a qual foi condenada a pagar. Esta condenação sobreveio após armazenar e continuamente comercializar dados pessoais da Autora sem seu consentimento.

Uso de outras Leis

O Recurso não foi provido, e com isso, a indenização foi integralmente mantida. Utilizaram os Magistrados como base legal outras leis, tais quais o Código de Defesa do Consumidor, Lei do Cadastro Positivo e o Marco Civil da Internet. Isto porque, quando ocorreram os fatos, a LGPD ainda não havia entrado em vigor, o que só veio ocorrer durante o curso do processo. Dessa forma, não poderia ser aplicada neste caso.

Haja vista que o foco destas outras leis são outras finalidades e não efetivamente resguardar os direitos do titular destes dados, comumente eram utilizadas em conjunto antes da vigência da LGPD, para casos dentro desta temática.

O que chama a atenção é a fundamentação da decisão.

A imprescindibilidade da LGPD

Para embasar seu entendimento, a LGPD foi utilizada em caráter “obter dictum” pelos Magistrados, ou seja, como argumento para complemento do raciocínio e compreensão da decisão, mesmo não constituindo parte de seu fundamento jurídico. Neste sentido, foram mencionados os artigos 2º, 7º, 8º, 15º e 17º, que tratam exatamente da necessidade da anuência prévia da pessoa para a coleta e armazenamento de seus dados.

Desta forma, evidencia-se a imprescindibilidade desta lei, pois, ainda que não aplicável no caso em tela, foi feito seu uso. Isto ocorre pela grande especificidade que carrega acerca deste tema, trazendo um fornecimento de base decisória muito mais confortável para os julgadores.

Ante o exposto, ainda que tenha sido possível os Magistrados embasarem a decisão fazendo uso das legislações até então disponíveis, unindo alguns textos de lei que se complementaram, com a efetiva utilização da LGPD no caso concreto muito mais fluída, incisiva e tranquila seria, sem dúvidas, a elaboração e constituição deste Acórdão. Exatamente para este fim, essa importante lei foi elaborada e sancionada. Justamente para aumentar a proteção ao titular de dados, criando infrações que abordam e ampliam o rol de situações nas quais poderá estar em risco, e que antes ficava à mercê de leis com outras finalidades para ter seus direitos assegurados.

Acórdão nº 2020.0000089631

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Caio César Rodrigues é estudante de Direito pela Universidade São Judas Tadeu, atualmente no 5º semestre, e estagiário no escritório Zilveti Advogados, atuando na área do Direito Contencioso Cível.

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